O medo de andar na rua não veio na mala

Em uma das minhas últimas semanas em Salvador tive o desprazer de presenciar dois assaltos em pleno trânsito. No primeiro duas meninas foram assaltadas no mesmo ônibus em que eu estava. No segundo o marginal arrombou o vidro de um carro que estava parado em um engarrafamento. Da janela do ônibus eu vi tudo acontecer. Quem já foi assaltado ou já viu um acontecer sabe que a sensação é de medo, depois impotência e por último revolta. Não gosto de ficar aqui comparando Toronto a Salvador porque minha intenção nessas postagens nunca foi essa. Mas, como qualquer jovem que cresce em uma grande cidade brasileira, passei a vida inteira ouvindo que por estar vulnerável a uma situação dessas eu devo ter cuidado ao andar na rua, dirigir, ir ao banco etc. Me acostumar com a atmosfera de segurança canadense chegou a ser engraçado justamente por causa dessas defesas. 

O Canadá é o país que conta com uma das taxas mais baixas de homicídios por número de habitantes de toda a América, segundo estudos de 2012 do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC). Pude ter a noção disso com poucas semanas vivendo por aqui. As pessoas andam em qualquer lugar completamente despreocupadas. Não hesitam em atender o celular em uma avenida movimentada ou em uma rua deserta, usar o tablet em pleno ponto de ônibus ou o notebook no metrô. Até o fone de ouvido as pessoas usam conectados ao celular com o fio por fora da roupa.

Na primeira vez que eu saí à noite, voltei sozinho e de madrugada. Isso ainda sem conhecer muito da cidade. Confesso que à primeira vista a sensação de andar só em uma rua deserta não foi nem um pouco agradável. Mas lá pela segunda ou terceira vez eu já estava mais tranquilo. Fui me acostumando e aí o medo e o receio foram embora. Claro que vez ou outra surge aquela desconfiança de algum lugar ou de alguém, mas a cidade tem um clima de paz tão grande que você acaba ficando naturalmente tranquilo. Os policiais daqui, por sinal, são super educados, solícitos e de fato fazem você se sentir ainda mais seguro na presença deles.

Muro e grade são coisas que eu quase não não vejo por aqui. A maioria das casas e até prédios tem no máximo, e quando tem, apenas um cercado que é muito mais por decoração, proteção do jardim e delimitação do terreno do que por qualquer outra coisa. E a primeira porta da casa normalmente já é a que dá na da sala.

Quando eu estava procurando uma casa para morar aqui pós período de homestay, cheguei a encontrar um apartamento com um preço bom, mas em uma região bem afastada do centro da cidade. Amigos, conhecidos e até professores me aconselharam a não ir pra lá porque se tratava da área mais perigosa da cidade. Mas ninguém sabia explicar ao certo qual é o perigo. Eu cheguei a visitar o apartamento e achei a vizinhança aparentemente normal. Um tempo depois eu fui descobrir que a área não é muito recomendada porque algumas gangues esporadicamente iam ao local para trocar ofensas e brigar. Só que esses confrontos muitas vezes acabavam em gente baleada. Mas como disse uma professora minha e eu infelizmente tive que concordar: - não chega a ser tão perigoso quanto uma favela do Rio de Janeiro!

Apesar de o sistema de segurança ser eficiente e de os índices de criminalidade serem baixos, isso não significa que a gente pode sair por aí dando ''sorte ao azar''. Ter cautela é sempre bom. Eu ainda não conheci uma pessoa que já tenha sido assaltada ou sofrido um sequestro relâmpago em Toronto. Quando eu ou qualquer outro brasileiro comenta com algum gringo do quanto isso é comum no Brasil, eles ficam apavorados. E com razão. Eu mesmo já fui assaltado quatro vezes em Salvador. E não faço ideia de quantos amigos meus já passaram por este tipo de experiência. É tão frequente que chega a cair na banalização. E nós somos tão conformados que muitas vezes colocamos a culpa na própria vitima por estar com o celular ou a carteira muito evidentes no bolso da calça, ou a corrente no pescoço, o fone de ouvido...

Suicídio

Mesmo sendo um país maravilhoso os índices de suicídio por aqui são estranhamente altos. Maiores que os do Brasil. Teve época em que quase toda semana eu ouvia alguém falar sobre um caso desses. Um amigo canadense recentemente viu uma mulher caindo de um prédio. Horas mais tarde ele ficou sabendo que se tratava de mais um caso de suicídio. Andei lendo sobre o assunto e vi que há um estudo que aponta que países considerados felizes normalmente tem uma quantidade maior de casos dessa espécie porque para a pessoa que pensa em atentar contra a própria vida, viver em um lugar ''perfeito'', que praticamente respira felicidade, aumenta o sentimento de tristeza e depressão. Quem se interessar pelo assunto pode dar uma olhada aqui e aqui.

Imagens: http://instagram.com/arturqzz

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